PROCESSO Nº 314958/2016-4-GAC
INTERESSADO: ASSEMBLEIA
LEGISLATIVA
ASSUNTO: Projeto de Lei nº
210/2015
O GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, no uso das suas atribuições constitucionais (art. 49, § 1º, da Constituição Estadual), decide VETAR INTEGRALMENTE o Projeto de Lei nº 210/15, constante dos autos do Processo nº 2619/15 – PL/SL, que “Dispõe sobre o uso da nota do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE), como critério avaliativo de desempate em concursos públicos para provimento de cargos de nível superior, no âmbito do Estado do Rio Grande do Norte”, de iniciativa de Sua Excelência o Senhor Deputado HERMANO MORAES, aprovado pela Assembleia Legislativa em Sessão Plenária realizada em 14 de julho de 2016, de acordo com as razões que seguem.
O Projeto de Lei pretende, em apertada síntese, autorizar a utilização da nota do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE) como critério avaliativo de desempate em concursos públicos para provimento de cargos de nível superior no âmbito do Estado do Rio Grande do Norte.
Como se vê, a Proposição Normativa pretende alterar critérios de provimento de cargos públicos, alcançando não apenas a administração pública estadual, como também as municipais.
No entanto, o Projeto de Lei aprovado pelo Parlamento Estadual afronta duplamente a Constituição Estadual, pois, à medida que busca definir critério de provimento de cargos públicos, insere-se no âmbito da competência reservada à disciplina por lei complementar de iniciativa do Chefe do Poder Executivo (art. 46, § 1º, II, “b” e “c”, e art. 48, parágrafo único, IV e V).
Observe-se, ainda, que a Proposta Normativa, por não
restringir expressamente sua aplicação ao Poder Executivo, abrange todos os
Poderes, o Ministério Público, o Tribunal de Contas e a Defensoria Pública, os
quais detém, outrossim, competência de iniciativa legislativa para dispor sobre
o estatuto de seus servidores.
Nesse diapasão, convém destacar que nem mesmo a sanção a projeto de lei no qual se tenha constatado vício de iniciativa teria o condão de convalidar a norma que se introduziria no ordenamento jurídico, como se infere deste entendimento firmado no v. Supremo Tribunal Federal:
“O desrespeito à prerrogativa de iniciar o processo de positivação do Direito, gerado pela usurpação de poder sujeito à cláusula de reserva, traduz vício jurídico de gravidade inquestionável, cuja ocorrência reflete típica hipótese de inconstitucionalidade formal, apta a infirmar, de modo irremissível, a própria integridade do ato legislativo eventualmente editado”. (STF, Pleno, Adin n.º 1.391-2/SP, Rel. Ministro Celso de Mello, Diário de Justiça, Seção I, 28 nov 1997, p. 62.216, apud Alexandre de Moraes, Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional, São Paulo, Atlas, 2002, p. 1.098).
“A sanção do projeto de lei não convalida o vício de inconstitucionalidade resultante da usurpação do poder de iniciativa. A ulterior aquiescência do chefe do Poder Executivo, mediante sanção do projeto de lei, ainda quando dele seja a prerrogativa usurpada, não tem o condão de sanar o vício radical da inconstitucionalidade. Insubsistência da Súmula 5/STF” (ADI 2.867, rel. min. Celso de Mello, julgamento em 3-12-2003, Plenário, DJ de 9-2-2007.) No mesmo sentido: ADI 2.305, rel. min. Cezar Peluso, julgamento em 30-6-2011, Plenário, DJE de 5-8-2011.
Sobre o assunto, ALEXANDRE DE MORAES esclarece o quanto segue:
“Acreditamos não ser possível suprir o vício de iniciativa com a sanção, pois tal vício macula de nulidade toda a formação da lei, não podendo ser convalidado pela futura sanção presidencial”.
Como visto, o Projeto de Lei aprovado pelo Parlamento Estadual, embora envolva uma destacada preocupação do Poder Público com o aproveitamento da nota do ENADE como critério de desempate em concursos públicos, não reúne, efetivamente, condições para ser inserto no ordenamento jurídico-positivo estadual.
Nessa toada, apesar da relevância da Proposição, por razão de constitucionalidade, é necessário impor o seu veto integral, pois, no exercício do controle preventivo de constitucionalidade[1], o Chefe do Poder Executivo do Estado deve impedir o ingresso no ordenamento jurídico de norma portadora de vícios de validade (art. 49, § 1º da Constituição Estadual[2]).
Diante dos vícios jurídicos formais e materiais de ordem constitucional acima firmados, resolvo VETAR INTEGRALMENTE o Projeto de Lei nº 210/15, constante dos autos do Processo nº 2619/15 – PL/SL.
Dê-se ciência à
Egrégia Assembleia Legislativa do teor do texto vetado, para sua devida
apreciação, em conformidade com o disposto no art. 49, § 1º, da Constituição
Estadual.
Encontrando-se
a Assembleia Legislativa em recesso, publiquem-se as presentes Razões de Veto
no Diário Oficial do Estado (DOE), para os devidos fins constitucionais.
Palácio dos Despachos de Lagoa Nova, em Natal/RN, 04 de
agosto de 2016, 195º da Independência e 128º da República.
Robinson
Faria
GOVERNADOR
[1] “Controle preventivo ocorre quando a lei ou ato normativo ainda não entrou em vigor, melhor dizendo, encontra-se em processo de formação. O objetivo desse tipo de fiscalização é, justamente, o de evitar que ingresse no ordenamento jurídico, produzindo efeitos, normas inconstitucionais”. Zeno Veloso, Controle jurisdicional de constitucionalidade, 2ª ed., Belo Horizonte, Editora Del Rey, 2000, p. 155.
[2] “Art. 49. (...)
§ 1º Se o Governador do Estado considerar o projeto, no todo ou em parte, inconstitucional ou contrário ao interesse público, pode vetá-lo, total ou parcialmente, no prazo de quinze (15) dias úteis, contados da data do recebimento, comunicando, dentro de quarenta e oito (48) horas, ao Presidente da Assembleia Legislativa os motivos do veto.
(...)”.